Ossuário

Tua voz aguda não mais me assusta,
Nem tuas mãos sulcadas;
Quiça teus olhos, outrora negros,
Agora azulados.
Ah, pai!
O que te resta é uma galeria de ossos.
E, pergunto eu:
Cadê tua prole infértil?
Tua postura impertigada?
Teu egoísmo?
Tudo agora são míseras lembranças:
Um abraço negado;
Um olhar de esguelha;
A perna cruzada;
A Bíblia na mão esquerda;
A direita de apoio ao queixo;
Um oscilar do corpo.
Entoemos ladainhas ao teu nome! Não.
Façamos teu epitáfio! Não.
Não, tua presença sempre foi muda.
(Se ao menos tivesses cantando pra eu dormir).
No silêncio jazem,
Todos os domingos,
Os sábados de feira livre,
Tuas alparcas de couro,
Tua violência contida,
As escarradas ruidosas,
Teu orgulho de roceiro.
Jazem todos atrás do guarda-roupas;
Junto ao cartão nunca entregue,
E nele a declaração não proferida:
Eu te amo pai.
Luiz Eduardo Ferreira
Enviado por Luiz Eduardo Ferreira em 21/09/2014
Reeditado em 13/08/2017
Código do texto: T4970012
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