A luz distorce os homens

Arrastei tempo demais os corpos pesados.

O cheiro, o emaranhado de fios.

Os envelopes rasgados, a cola dos adesivos nos vidros.

O sol marcou as bordas, todos os dias acordado.

E o que não marcou?

Talvez a pele, ainda muito branca

Talvez a areia, ainda muito fria.

Talvez nada disso. O Sol nem mesmo aparece por aqui quando eu não estou.

E quanto estou, nem sei bem do que se trata.

Muitas vezes não escuto, outras finjo que não existe manhã e sempre me acho no escuro.

Você me pediu pra não falar de futuro.

Pois bem, digo que não consigo.

Não consigo não dizer que o futuro não é nada.

Esse escuro de que falo, esse tanto que comporta tudo, é por ele que ando.

Claro diante dos olhos, negro atrás das cores.

Eu não sei falar de nada além do que já disse.

"Nenhum homem é criado por Deus para sofrer".

Se nenhum Deus é criado no sofrer dos homens, o que será de mim?

E de Deus?

Tão escuro, nem preciso de tantas pupilas.

Só preciso explicar o que vejo.

Queria não precisar o tempo todo.

Queria que o escuro fosse tudo.

Quem sabe não perceber seja o caminho?

Esqueça, já percebemos.

Tentar não falar de futuro ainda é perceber que ele existe.

Desistir de tentar.

É tudo tão escuro que talvez eu não saiba desistir.

É tudo tão escuro que talvez não eu saiba.

Fernando Cesar
Enviado por Fernando Cesar em 20/11/2014
Reeditado em 20/11/2014
Código do texto: T5042811
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