Tudo é bruto,banal e amargo
a gente acorda cedo
levanta e vai trabalhar
junto com uma multidão
come o pão d'ontem
a gente se sacrifica
pelos filhos ,pela família
vive que nem um cão
lambendo a mão do patrão
a gente sobe no ônibus
de segunda a segunda
paga caro a condução
paga o que eles querem
e tem de se apressar
para chegar no horário
pois se atrasar quinze minutos
cabeças vão rolar
quando
quando tudo vai mudar
todo mundo pergunta
a vida vai melhorar
só tem um buraco na nossa frente
quando vai mudar
quando o diabo deixar
quando deus quiser
são tantos problemas para resolver
não sei o que fazer
tantas costuras para entregar
tantas linhas para entender
tantas pedras para remover
algumas pessoas viram as costas
algumas pessoas somem
e nem atendem o telefone
na rua tem passeata de black bloc
protesto por salário/demissão/moradia
mst/passe livre/je suis Charlie
vivemos numa sociedade infernal
quem tem emprego corre
enfrentamos bandidos/burocracia/trânsito
calor/enchente/tempestade
violência policial/bala de borracha/gás pimenta
nesta terra não tem mais ditadura
guerra fria/regime de opressão
presidente general de cavalaria
a gente tem democracia
a gente tem liberdade de expressão
mas o político rouba o povo
mas falta água/luz
mas falta saúde/educação
a gente vai na igreja de domingo
se ajoelha e reza o pai nosso
ouve o sermão da montanha
e a profecia do fim dos tempos
a gente no confessionário relembra os pecados
e pede perdão eterno para padre
bem aventurados são os que dão o dinheiro do bolso
na hora da coleta
no fim do expediente
vambora para casa
nada de passar no boteco do seu Manoel de Barros
penso numa solução impossível para o saldo do banco
enquanto o trem sacode nos trilhos da Santos- Jundiaí
encontro a mulher impaciente na cozinha
mas só tenho esperança/melhoral/dor de dente
e alguns trocados na carteira
quando
quando tudo vai mudar
todo mundo pergunta
a vida vai melhorar
só tem um buraco na nossa frente
quando vai mudar
quando o diabo deixar
quando deus quiser