FRONTISPÍCIO

por que não pode a Rima em duplo diapasão

Como um lábio gemer e urrar como um trovão?...

Sintetizar a dor num grito lancinante,

Ter do raio o bramir - torva cacofonia -

E exclamar pavorosa a música sombria,

Que eu quero que ela cante?!

Por que não pode o Verso, histério, de bruços,

Como se fosse vivo, estalar em soluços?

Gemer, chorar, rugir, num metro que estertore

E, assim como um tambor, rufar tragicamente

A marcha funeral, soturna, comovente,

Que eu quero que ele chore?!

Por que não pode estrofe audaz bruta, espoucando,

Pelas outras reboar como um trovão rolando?

E, cheia de urros, de ais, num brado alto estruja,

Pelo período em fora ecoar clangorosa

A hipérbole selvage, a música assombrosa

Que eu quero que ela ruja?!

Impotência do Verso em traduzir a Idéia!

Fraqueza da palavra! anemia da Imagem,

Que não pode gritar!

Como és fraco, poeta! e no entanto revolta-se

No teu crânio - essa gruta - a luz da inspiração

Que não pode gritar!

Impotência da Rima! impotência do Tropo!

Para gritar com a Dor, para gemer com o Pranto,

Como és fraca, Poesia!

Como a Idéia é grande e como a frase é curta!

Para andar com a lava elétrica do Gênio,

Estrofe como és fria!

Homens! a inspiração não cabe numa rima;

Na poesia não cabe o que um poeta quer,

O que um poeta pensa!

O soneto é pequeno, a onde tão acanhada

Que a Estrofe arrebenta e a cadência se parte

Quando a Idéia imensa

Explode e faz recuar as vãs barreiras da Arte!

1890.

DR. EGAS MONIZ BARRETO DE ARAGÃO (PÉTHION DE VILLAR)
Enviado por Francisco Atila Moniz de Aragão em 23/01/2015
Código do texto: T5111815
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