FRONTISPÍCIO
por que não pode a Rima em duplo diapasão
Como um lábio gemer e urrar como um trovão?...
Sintetizar a dor num grito lancinante,
Ter do raio o bramir - torva cacofonia -
E exclamar pavorosa a música sombria,
Que eu quero que ela cante?!
Por que não pode o Verso, histério, de bruços,
Como se fosse vivo, estalar em soluços?
Gemer, chorar, rugir, num metro que estertore
E, assim como um tambor, rufar tragicamente
A marcha funeral, soturna, comovente,
Que eu quero que ele chore?!
Por que não pode estrofe audaz bruta, espoucando,
Pelas outras reboar como um trovão rolando?
E, cheia de urros, de ais, num brado alto estruja,
Pelo período em fora ecoar clangorosa
A hipérbole selvage, a música assombrosa
Que eu quero que ela ruja?!
Impotência do Verso em traduzir a Idéia!
Fraqueza da palavra! anemia da Imagem,
Que não pode gritar!
Como és fraco, poeta! e no entanto revolta-se
No teu crânio - essa gruta - a luz da inspiração
Que não pode gritar!
Impotência da Rima! impotência do Tropo!
Para gritar com a Dor, para gemer com o Pranto,
Como és fraca, Poesia!
Como a Idéia é grande e como a frase é curta!
Para andar com a lava elétrica do Gênio,
Estrofe como és fria!
Homens! a inspiração não cabe numa rima;
Na poesia não cabe o que um poeta quer,
O que um poeta pensa!
O soneto é pequeno, a onde tão acanhada
Que a Estrofe arrebenta e a cadência se parte
Quando a Idéia imensa
Explode e faz recuar as vãs barreiras da Arte!
1890.