PAIXÃO

1
Nunca mais vou sair
do Ajuntament de Girona.
Estou à mercê dessa
cidade e não vou
abandonar aquilo que fui
dentro de suas muralhas
para penetrar no futuro
essa fogueira escura.

Não quero novos itinerários.

Sei que existem
nuevos rincones
y nuevos descobrimientos.

Mas eu quero ficar em Girona.

Preciso descobrir
entre a luz e a pedra,
a mão que prende
a eternidade ao nada.
2
Me deixem ficar na Catedral
de Girona rodeado de
vidrieras,
platas repujadas,
anjos e esculturas.
Sei que os toques manuais dos sinos
desapareceram da torre
e os bronzes sagrados
já não vibram ritmos tradicionais.
Mas o que importa isso
se aqui encontrei a proporção
exata dos homens e de Deus..
3
Em nenhum outro templo
gótico eu percebi pulsar tanto
a serenidade e o silêncio.
Aqui até os santos imploram
para não sair dos altares.
4
Nesta Igreja de Sant Feliu
entre sarcófagos pagãos e cristãos
eu permaneço de mãos dadas
com o impossível. Até o Cristo
de alabastro se comove com
as palavras que ainda vivem
na boca do padre e irrompem
resolutas, sagradas, sangradas.
É pela boca que começa
o juízo inicial . E final.
5
Como se fosses minha e
jamais me abandonasses,
Assim te busco, impossível
cidade que me liberta do
chão, do céu, desse canto
desse beco e dessa esquina
escondida nos mil disfarces
da palavra.

Versos da solidão,

cotovia sagrada.

Eu te sagro nesta praça

Eu te sangro nos beirais
precipitados do meu amor