ATRAPALHAÇÃO

(LXXVIII)

"De nos coeurs entre- eux faisons un échange;

Rendez-moi le vôtre et gardez le mien".

A. Dumas Fils.

Um vez, e não sei como se deu o fato,

Até pensava em ti naquela ocasião,

E quando penso em ti fico bastante abstrato,

Deixei à beira-mar cair meu coração.

"Era por uma tarde esplêndida de agosto!..."

Porém, ou não limpasse os vidros da luneta,

Ou me afligisse então um intimo desgosto,

A própria luz do sol me parecia preta!...

Vieste logo após pelo mesmo caminho:

Encontraste-o perdido... inexplicavel lei

Do acaso! Abriste as mãos num súbito carinho,

Apanhaste e escondeste o pobre; onde? não sei.

E não m'o queres dar, cruel, por forma alguma!

Como hei de liquidar, agora esta questão?...

Levo-te aos tribunais, uma demanda em suma,

Para forçar-te, assim à restituição.

Mas seria uma asneira o mundo inteiro diz;

O juri é tão venal!... encolheria as unhas;

Enguiçarias tudo, até mesmo o juiz!

Perderia... e depois... não houve testemunhas.

Não sei como sair desta embrulhada imensa!

Parlamentemos, filha, e de ânimos serenos.

Tu és injusta e má, raciocina e pensa:

Possuis dois corações e eu nem um ao menos!

Mas espera! de chofre uma idéia me vem,

Uma idéia feliz que o próprio Deus me evoca:

Olha! tu não possuis dois corações?... Pois bem,

Guarda contigo o meu e dá-me o teu em troca...

Agosto de 1894.

LIRA MODERNA - Diário de Notícias.

DR. EGAS MONIZ BARRETO DE ARAGÃO (PÉTHION DE VILLAR)
Enviado por Francisco Atila Moniz de Aragão em 13/02/2015
Código do texto: T5136250
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