A PONTE

(Paráfrase)

Achava-me sozinho à beira da amplidão,

Extático, de pé, sondando a escuridão:

Tudo calmo em redor, tudo silencioso;

Escancarado em frente, enorme e pavoroso,

O báratro do qual ninguém conhece o fundo

E em cujo éter sutil gravita o nosso mundo!

Senti-me então perdido, eu, mísero precito,

Em face desse triste e lúgubre infinito!

Das trevas através, no fundo lá dos céus,

Um clarão se avistava: era a sombra de Deus!

De joelhos caí, desesperadamente!

E pávido, exclamei: - Pobre alma impenitente!

Para chegar até perto de Deus, um dia,

Uma ponte elevar necessário seria ,

Tão grande que, do abismo as bordas encontradas,

Ligasse a terra ao céu, sobre milhões de arcadas;

E para ao outro lado alguém poder chegar

Mil séculos talvez precisaria andar!

Mas, quem construirá tão formidavel ponte?

Ninguém! Blasfemei eu...

Na fímbria do horizonte,

Enquanto devassava as tenebras em frente

Vi de chofre surgir um vulto alvinitente,

Iluminando todo o báratro sombrio;

Esse vulto, não sei porque, tinha o feitio

Duma lágrima enorme e vinha pelo ar,

Cruzando as alvas mãos, vestido de luar;

Tinha a fronte dum anjo e o olhar duma criança!

Vendo-o senti não sei que celeste esperança...

Apontou-me o abismo aonde tudo vai ter,

Tão largo que nem pode um eco responder

E após falou-me: - Eleva a Deus o pensamento

Que a ponte elevarás também neste momento!

- Quem és tu? - perguntei à pálida visão.

- Não me conheces, pois?

-O teu nome? - A Oração!

1897.

DR. EGAS MONIZ BARRETO DE ARAGÃO (PÉTHION DE VILLAR)
Enviado por Francisco Atila Moniz de Aragão em 14/02/2015
Reeditado em 14/02/2015
Código do texto: T5137071
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.