FOLIA

São três dias, apenas três dias,
em que o homem sacode dos ombros
essa canga que tolhe seus sonhos,
e o mantém acorrentado
ao rebanho tacanho e mirrado,
que rumina e regurgita,
sem notar sua desdita,
na sêca pastagem sem grama.

São três dias, apenas três dias,
em que o homem, esquecido da fome,
não recorda, sequer, do seu nome
e com o peito estuando de riso
solta o corpo em alegre delírio,
sem lembrar da tapera onde vive,
ou da enxerga onde à noite ele ama.

São três dias, apenas três dias,
em que tapa os ouvidos ao medo
da miséria que ronda em segredo,
e se atira, aguerrido, arrojado,
pés descalços no asfalto molhado,
a camisa coberta de lama...

São três dias, apenas três dias,
de ilusória liberdade,
não importa. Na verdade,
são três dias... apenas três dias.



(MAR-92)