O AMOR BÊBEDO

(XVIII)

(IMPRESSIONISMO)

( Paráfrase de Th. de Banville)

Atraido pelo bafo imundo do chiqueiro

Às vezes o Amor transformas-se em trapeiro.

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O Amor! a divindade olímpica, gioriosa,

De asas brancas de nove e corpo cor de rosa!

O Amor que era a própria Arte, o Ideal, a Poesia.

O noivo de Psichê, o deus da fantasia,

O Amor numa taverna entrou cinicamente

E no balcão de zinco encheu-se de aguardente!

Ele que transmutava os leões em cordeiros,

E fazia chorar os lobos carniceiros,

Nas ruas alta noite, ei-lo agora enlameado;

Como um velho bandalho em trapos enrolado

Traz um saco no ombro e um cachimbo na boca,

Torce-lhe o corpo todo uma risada louca;

Gesticula, assovia, acanalhadamente,

Rouquenho a gargantear uma chula indecente.

As asas amarrou, os lindo cachos de ouro,

Pra escondê-los, cobriu com vil boné de couro.

Zinquezagueia, avança, aos rudes trambolhões,

Remexendo curioso os fétidos montões,

De rasto, vesgo o olhar, nas trevas mais se interno,

Com um gancho na mão e na outra uma lanterna.

Está bêbedo o Amor! Doi vê-lo aos solavancos,

Pelas ruas em fora, arrastando os tamancos;

Fareja, ergue o nariz e como um cão leproso

Que desterra a carniça e a mastiga guloso,

Lá vai o Amor - trapeiro, o Amor bestializado,

Ignóbil, sem pudor, materializado,

Saciar, torpe, no que há mais de nojento e impuro

Da orgia estercorária, a fome do monturo.

Fevereiro de 1893.

LIRA MODERNA - Diário de Notícias.

DR. EGAS MONIZ BARRETO DE ARAGÃO (PÉTHION DE VILLAR)
Enviado por Francisco Atila Moniz de Aragão em 16/02/2015
Reeditado em 16/02/2015
Código do texto: T5139006
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