NOSTALGIA DO ALÉM

OLAVO BILAC

"wie dort sich die Wolken

Um Felven verziehen!

Da mõcht 'ich hinuber

Da mõchtT 'ich wohl hin!"

(GOETHE - "SEHNSUCHT", Lieder)

Jamais pude descer, preso de atroz cinismo,

Ensanguentando os pés de místico e de poeta,

Pelo tunel fatal que sempre em linha reta

Conduz de rasto um moço à noite Anarquismo.

Jamais pude! Minh'alma, a borboleta azul,

Voa e só haure o mel que a flor do Belo encerra!

Detesto o positivo, odeio o "terra-a-terra",

Prefiro o céu ao esterco, as nuvens ao paul!

Eu vivo sempre triste, eu vivo sempre imerso

Nas brumas do Ideal, nos sonhos, nas quimeras;

E se rio é o aroma, é o ar das primaveras

Que brinca no meu lábio e cheira no meu verso.

Eu sinto a nostalgia intérmina do Além,

De uma outra vida sou, pertenço a outro planeta,

Sinto-o; quem voar, mas a torva grilheta

Do meu corpo é que assim me prende e me retém.

Vivo sombrio e só, mas sei que amo e me ama

Alguém de outro céu - uma noiva saudosa -

Loura visão envolta em névoa cor de rosa

Que alta noite a gemer me interroga e me chama.

Por isso espeito-a ansioso e busco-a em todo mundo

E em vez da noiva ideal que procuro chorando,

Só da Mulher encontro o coração nefando,

Só da luxúria vejo o cogumelo imundo.

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Eu sou um desterrado, um precito, sei bem;

Faz-me saudade o Céu - minha pátria perdida -

Quem fugir, voltar, causa-me nojo a Vida,

Eu sinto a nostalgia intérmina do Além!

1893. "VIA DOLOROSA".

DR. EGAS MONIZ BARRETO DE ARAGÃO (PÉTHION DE VILLAR)
Enviado por Francisco Atila Moniz de Aragão em 18/02/2015
Reeditado em 18/02/2015
Código do texto: T5141121
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