Nas ruas nada a declarar

I

domingo

bricolage no andar de cima

eu deitado de bruços

lá fora

nada a registar

ao menos tu

fernando

conseguiste ver quem passa

olhando a tabacaria

mas eu

deixa lá

como um cohocolate

talvez assim o sono venha

domingo

bricolage no andar de cima

benditos os dias

em que se passeava de eléctrico

apenas por andar de eléctrico

hoje só se for pelos pasteis de belém

ou pela pela bola

hoje

andar na rua

cansa

porque não há rua

nem gente nela

na verdade

nem sei o que por lá anda

talvez o nada comigo lá dentro

II

hoje

temos em casa uma coisa

e toda a gente

olha para ela

e acredita em tudo

o que ela diz

ai as tardes de domingo

com os cinemas cheios

e gente pelas ruas

III

poderias ter tudo

preferiste errar pelas ruas

ainda ruas

estar na brasileira do chiado

sentando um pouco

o rabo

à conversa

ou simplesmente

vendo

como o bernardo

te ensinou

nos dias de melancolia

eu tive o que quis

ou o que penso

ter querido

sei lá

olha

roupa lavada

e comida na mesa

não me falta

talvez me vicie

talvez me reste

a esperança

de sentar o rabo

de onde tu levantaste o teu

sei lá

IV

para onde vou desconhecido de mim

sem tardes de domingo

com gente nas ruas