Seguindo em frente

Andando/

Sob um sol escaldante/

Um cão assentou-se na calçada/

Descalça/

Sob a sombra de uma árvore/

Morto à sede/

Nem titubeou/

Avistou uma poça/

De água da chuva parada/

Foi lá e bebeu aquela água imunda/

Sob o mesmo sol causticante/

Um ambulante/

Cansado de roda a cidade/

Vendendo qualquer coisa pra alimentar a família/

Assentou-se na calçada/

Limpou o rosto do suor/

Como a pensar em sua vida/

Olhou para o horizonte/

Lembrou de sua casa/

E seguiu como empurrado ao trabalho/

Numa escola em frente/

O sol torrava a sala/

Mas o filho do ambulante estava lá/

E nos olhos do menino/

Ele respondia/

Como era está ali/

Comer num dia/

E ficar sem merenda no outro/

Para que outra turma tivesse o que comer/

Estudar sob um calor infernal/

Beber água de uma caixa/

Sem manutenção/

Ver os seus irmãos com fome/

Pedir perdão a Deus de todos os homens/

E no dia seguinte vende picolé/

O que se pode dizer/

Se empresários/

Políticos e cidadãos/

Abusam de corrupção/

Da boa fé/

Porque a lei foi feita pra justificar/

Porque a escola nossa foi feita pra apascentar/

Porque o cão não pensa/

Mas sabe da sede a fome que dá/

Mesmo assim segue sem rumo/