O PINTOR, O COSTUREIRO E A DAMA (para Olavo Bilac)

Aqui está o pintor, retoma seu árduo trabalho

de retratar a dama chamada literatura

em grande alegoria esboçada no painel

onde aparecem os traços de um costureiro

atendendo uma elegante dama em seu ateliê.

Esbanja requinte, mistura estilos

define o que fica fora da moldura.

É na paleta das sílabas que recolhe

o rubor das raparigas para não faltar

na composição as delicias da infância.

É tarde quando a fazenda chega às mãos do costureiro,

o sol se pôs sobre a ampla superfície estampada.

Finalmente, é tarde. A luz é inventada.

O pintor não é conciso nem verborrágico,

a cena também comporta o vazio,

o insuportável para a moldura.

Mãos ao corte,

que tem boa caída as figuras alinhavadas

e o tecido cru expressa o cansaço do algodão

nas sacas empoeiradas sem uso.

Acrescenta para cortar o redor,

para cercear e decotar, recorta

para aparar e para dividir, acentua

tão necessária para cerzir a emenda

a fina luz que incide sobre a dama.

O pintor separa das cores primas

os sons siameses, e afasta

o elemento

opaco do sem cor.

Para o fabrico do belo vestido

cinge o modelo à altura dos lombos.

Desdita do sapateiro a Apeles.

Assim a língua, dama culta e bela,

encontra vigor na expressão da tinta

e sua força na estabilidade do salto.

Logo o quadro estará pronto

grande painel decorativo

ocupado no centro

pela dama

ainda nua.

*

*

Baltazar

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 24/05/2015
Reeditado em 17/07/2017
Código do texto: T5253614
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.