Aonde?

aonde as flores

ainda olham,

lentíssimas,

quando caminhas

como a estrela da tarde

antes de chegar o luar

esquecida da noite

e pela noite esquecida?

aonde os frutos

desatam-se e caem

na memória da sombra das árvores

e deixam a primavera imóvel

e as tardes nas minhas mãos?

aonde as chuvas

partem sozinhas rumo aos rios

molhadas pela solidão do sol poente?

aonde o dia

mistura-se ao esquecimento

e retorna à ausência onde

andam os caminhos sem memória

e os abandonos falam de saudades?

aonde tuas mãos

desarrumam as chuvas

e afagam as sombras

das palavras que ainda não te disse?

aonde teus pés

caminham sob o firmamento

e a mansuetude do dia demorando a nos dizer?

aonde teus olhos

encontram a noite,

passando lenta e sonora,

passando meiga e serena

semeando o mundo

com o sopro denso e escuro?

aonde os teus lábios

(e só os teus lábios podem)

dizer o que ainda sou?