A PEDRA

Estou do outro lado da estrada e vejo-te

afastada da civilização ocidental.

Não és a drummondiana,

empecilho, aporética.

És a da quietude, à margem humana,

senhorial.

Nunca viste em sonho a face de Eusébio de Cesaréia.

Dormes (dormes?) impoluta, quase sorrindo para mim.

Sem anistia dos meus receios,

à serviço de alguma idéia,

trago-te, como escravo dos séculos,

perguntas:

Que idade tens? Com que meios

te formaste a compreender vazios?

Como jazes quieta e em oração te untas?

Estou do outro lado da estrada

no dolorido areal, inerte, e minha vida em ti fixa.

Paisagem e apego amigo.

Em teu silêncio um grito ancestral, dentro

de mim, mitifica-te no meu abrigo

de penduricalhos alucinadores.

Estou do outro lado da estrada e nem

o Sol te percebes, nem

o sereno te traz a coesão boêmia de dores.

Passas pelo meu instante como enigma.

Ao chão, eterna, sem vacilos,

guarda-te da elegia, se um dia fores.

Preciso desvendar-te, quando te inertizas

e me atordoas:

ventura ou destino o teu não-fluir, onde

nada deseja de ti uma ação, pensamento, história,

uma palavra sequer, fluente ou compulsiva.

Sinto que sabes que sou inteiro memória.

E por isso, me perdoas.

2007

www.alfredorossetti.com.br

ALFREDO ROSSETTI
Enviado por ALFREDO ROSSETTI em 30/06/2007
Código do texto: T547495