Simplesmente Vó

Para a Vó, que me lê na eternidade

A Vó era negra, negra...

Muito negra e muito terna.

O amor era sua regra,

Nesta vida, nesta terra.

Comandava com olhar doce

Da simples casa a vidinha

Assim para o que fosse

Uma ideia sempre tinha

A escada toda de terra

De um barranco perigoso

Conduzia quem quisesse

Para o olhar carinhoso

Da Vó sempre bem atenta

Aos netos em descaminhos,

Aos amigos em desgosto.

E vinha a palavra sincera,

Mesmo o olhar de reprovação

De quem cultura não tivera,

Mas educara o coração.

Às vezes eu subia a escada,

Algum presente lhe levava.

Depois da conversa animada,

Descia e um dia voltava...

Pra entregar-lhe umas bolachinhas,

Certa feita fui ter com a Vó.

Veio então uma das netinhas,

Seu semblante me encheu de dó.

Nem falar ela precisou,

Entendi o que se passava.

Para o céu Jesus chamou

Aquela que a menina amava.

Sem palavras, embargado,

Deixei-lhe o mimo da Vó.

Fui embora, contrariado,

E fiquei um tempo só

Pensando na negra bondosa

Cujo nome eu nem sabia,

Mas a expressão carinhosa

Desde muito me comovia.

Seria vó Ana, Maria,

Helena ou Consolação?

Pouco importa qual seria,

A Vó está no coração...