A FACE NO ESPELHO

Pela primeira vez

Olhei no espelho

E vi tantas coisas quebradas

E estupidamente não era eu.

Palavras, palavras quebradas

Amontoavam-se na minha cara amassada.

Tantas palavras tão doces, embargadas,

Afogadas na garganta flutuam à margem da pele.

Reconheci amor, amizade, felicidade, tempo.

Um pouco mais fundo da derme, numa análise,

Vi como pontas de facas em riste: dor, morte, medo

Eram estas palavras de pontas afiadas que quebravam todo o resto.

Comportavam-se como icebergs neste mar de linhas do rosto,

Frias espinhas cortantes, expostas no tempo-espaço do desespero.

Pela primeira vez olhei-me no espelho e não gostei do que vi

Palavras quebradas afundavam em mim, sem flores para velar

A delicadeza de outrora, em liquidez rompiam o reflexo indo morar

No avesso perfeito. Olhei no espelho, ele frio, riu de mim, de mim.