À MESA

A partir dos deslizes ingratos da tristeza

Enfeites translúcidos pingam sobre a mesa.

Rolam mundos e incertezas, mudos,

Escavados de um interno tempo nublado.

Dos méritos vencidos

Ao elo de afeto rompido

A borda da mesa é precipício.

Os olhos naufragam no rosto

À medida que a dor se agrava.

Dedos tontos brincam de Caronte, e conduzem

Os talheres a uma felicidade jamais alcançada.

São pedaços de metais limpos, sem norte e com fome,

São gôndolas vazias numa Veneza seca,

Pois não há qualquer intenção de se pôr a mesa.

Nos pratos nus das mãos côncavas em junção

Só há o choro desgostoso para maldita refeição.