Madrugadas vindas duma longa noite

Dai-me uma folha, que seja, uma só folha seca,

ao menos, para escrever.

Eu quero escrever as coisas inconcretas

que saem desta minha sã loucura misturada

com laivos de furibunda melancolia.

Quero imaginar outro mundo, um mundo novo

com malmequeres coloridos,

que apaguem do mapa, duma vez por todas

este mundo actual em guerra envolvido.

Oh ironia!

Oh madrugadas vindas duma longa noite,

ímpia noite, secreta e tenebrosa noite

que tarda tanto em fazer-se claro dia.

Passeio pelas varandas interiores da alma

e verifico que trago em mim as imagens

da limpidez da água que tanta guerra teima

em turvar e fazer lama.

Rios de sangue rubro como a rosa rubra

que já murcha exangue,

teimam em fazer murchar o meu poema.

Mas o meu poema há-de ser grande!

E, como uma espada levantada

quero que o gume aponte para novas formas

de pensar a humanidade e dê a um mundo novo

um novo rumo e um mais próspero e lindo horizonte.

E é desse novo mundo onde só floresça o trevo

de quatro folhas orvalhado

no odor do malmequer campestre

que eu hei-de compor poemas com mãos de mestre.

E com um nome sonante. Sim!

Porque eu quero para esses novos poemas

usar um nome sonante.

Um nome que vá para além de mim.

Para além do meu.

Não quero um nome como este tão simples, assim…

quero um nome sem ser nome de cédula de baptismo

com um som sonoro diferente do meu

para que todos fiquem a saber que quem escreveu

esses versos não fui eu mas outro para além de mim

o outro meu eu

como se o meu nome fosse os degraus na terra

e o outro eu os anéis que prende a Terra ao Céu.

in: "as ARMAS DO SILÊNCIO, desnudado" (poemas) e "MOMENTOS por dizer" - Antologia de Poemas (Edições de Autor)

Alvaro Giesta
Enviado por Alvaro Giesta em 06/08/2007
Reeditado em 14/10/2007
Código do texto: T594691
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