Fome

Madrugada.

Acordo faminta.

Não sou eu; é meu corpo.

Antes do eu forjado pelo mundo

ali, o corpo, também ele mapeado,

lutando em algum lugar, entre tecidos

ossos amolecidos, essa fome

que excede. Saio do lençol. Desabito

a seda coberta. Rompo os poros.

De dentro para fora, essa combustão.

O papel queimando. Palavra por palavra,

um desalinho febril. Encontro. Esquinas sem nome.

Uma dor, em ruínas, a boca. Uma violência

narrar sob o crivo da morada língua. Desvio.

Mordo. Engulo a saliva. Pouso ar-dente.

Deixo rastros. Lapido. Velo.

Eis que jaz, aqui, o corpo

erigido poema.