Desconstrução do esquecimento

Sim Isso é um álbum

Embora eu não queira me lembrar dessas fotografias

O que eu quero lembrar

está bombardeado na memória

Não quero a cena impressa a jato de tinta

O arquivo digital da cor

A pose do meu corpo sobreposta ao tempo

(Esse tempo que retorna)

E estas mãos, minhas mãos,

agarradas à minha pele

Sim Isso é um poema

E tantos poetas estão mortos

Na sonoridade do silêncio

O som dos bombardeios

Esse cheiro de corpos

Aqui quero lembrar

Não posso esquecer

Não quero esquecer

Não se deve esquecer

Quando a cor jorrada foi vermelho-vivo

Quando nomes se perderam

Bocas foram amarradas

Cadeiras acionadas

O choque O fuzil O golpe

E a verdade escondida

Esquecida nos escombros

Ausências

Ausências

Ausências

Fotografias de mortes nunca vistas

E aquelas publicadas nos jornais

Quartos vazios

Colos vazios

Olhos vazios

Vidas arrancadas a canhão

Sim Isso é um álbum

Mas é preciso atravessar

As imagens

Ouvir e tremer

Ver e chorar

Nunca esquecer

Ainda que não vividos

Estão aqui no chão do presente

esses golpes tão vivos.