o ancião
Eu sou um ancião
Eu vivo
e a ainda ando com os meus próprios pés
não trôpego, nem cambaleante
eu ando
e ainda vivo
e tenho os sonhos que me alimentam
e um “projeto” que me abriga
nas andanças, toda uma natureza vibrante
e um céu como teto
que no dia, quando sol, a luz me aquece
quando chuva, me esfria o corpo, não a alma
quando na noite, escurecido, o brilho da lua só me afaga
e as estrelas me fazem companhia estejam visíveis ou às ocultas e elas me condensam
aprendi a não contar nos dedos o tempo de um calendário
aprendi que minha contagem de tempo é o meu próprio tempo
aprendi que as pedras do percurso são os corações que lapido
e que os riachos que circundam os rios minhas próprias veias expostas.
ao longo da caminhada apreciei desertos vivos e mortos e prestes a morrer, em regiões
e amei desertos vivos, embora mortos, em humanos
ouvi críticas, conselhos, sofri do Bullying da ignorância, do preconceito, da tirania, das “guerras” inúteis a troco de “forças” que nada valem
e ouço se falar de um tempo em que eu deveria viver
mas eu não alcanço esse tempo de vida que se conta
porque não me inspira paixão e porque não me enquadro em padrões que me reduz, que me subtrai
e nada me apetece nessa contagem de tempo
e nada me desfavorece viver na solidão de mim mesma,
solidão enriquecida e povoada de desejos não mortos
e tudo me encanta quando um coração toca meu peito e quando toco o coração de alguém
e eu não quero seguir os conceitos, preceitos, crenças, cálculos
quero viver somente
nem que pra isso se revertam os ponteiros do fugaz relógio
nem que pra isso mostre ao mundo meu desafeto pela “impostura” de se viver dentro dos padrões que se impõem ferindo os meus próprios padrões.
porque eu sou um vulcão ativo que expele as lavas incandescentes que me compõem
porque eu sou um deserto que não se desertificou, que não se curvou diante da impossibilidade de viver seus próprios sonhos
eu sou um ancião
e ando
e ainda vivo
O ancião
Margarida Di