NARCISO


Eu o vi sorrindo, alheio aos dias maus
E surdo aos meus avisos, meus cuidados,
Seu carpe diem nosso honesto espanto.
O amor cantava em seu estar à parte
E livre como brisa, nuvem, sonhos
Pueris, cumpria instantes junto ao bosque.
É sempre assim o amar, tão pleno e prenhe
De dor – seu vir a ser tão belo e trágico.
Eu o vi chegar às águas, pombo tímido,
E nelas vendo...o outro, amá-lo e amá-lo,
Apenas, como nunca amara alguém.
A quem observe a entrega a tais enleios
Talvez ocorra a ameaça desse risco
Que atende por paixão, levada a sério –
Talvez o alarde pelo aviso inspire
Desprezo ou riso à cena impróprio e hostil.
A nada mais atende além do olhar
Que o olhar devolve em tudo desde o lago
– o mundo tem nas margens seu limite
E o quanto dele importa é belo e seu.
Fascínio, amor, destino e pouco siso
Conspiram nesse transe – o senso abstrai
Do espelho, insânia, imagem sem senões.
Eu o vi, por fim, dormindo, exausto à margem
Do lago, o ignoto sonho nossa angústia.
 
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Israel Rozário
Enviado por Israel Rozário em 08/10/2017
Código do texto: T6136315
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