para José Lara, TAL QUAL CORTEJO DE ESTRANHAS ESTRELAS MARINHAS

ontem uma chuva de estrelas caiu do céu

cada uma era

do tamanho de uma semente de maçã

ciranda de onze astros mais a lua

iluminava o campo

de cada canto do meu jardim.

*

não era sonho

a vida se repetindo?

*

mesmo fosso sob a cama

Egito acordado aguardava

a décima segunda estrela que no céu ficou

do alto ardia luz sobre minha dura face fria

iluminando em cada canto

campo jardim, cama fosso.

*

num átimo, eu também luzia,

obnubilado iluminado eu ardia

em vênia e salva, em ovação de despedida

em continência, em reverencia ao astro rei

desprendido

da constelação de Orion ou da de Capricórnio

bem sei.

*

astro mínimo um instante firme no orbe

qual semente da maçã sobre a terra cai

fecunda os campos fecundando o jardim

floriu num ramo o poema de um pomar

dissipando nevoas, descobrindo o fosso

vi que eu mesmo era José que dormia.

*

hoje o sol saiu bem cedo

iluminou o céu

iluminou o mar

e só,

nada mais aconteceu.

*

amanhã

o sol será multidão

rasgo no véu, luz sobre montanhas.

o sol há de sair ainda mais cedo

há de iluminar o além do longe

pois tudo é mar, tudo é dor

azul da minha, azul do breu.

*

do sol, quem dirá eu sou?

na ciranda dos astros, quem dirá eu sou?

filho do rei, quem dirá eu sou?

ao centro de nenhuma pátria, quem dirá eu sou?

destro escriba, quem dirá eu sou?

apátrida outro hebreu, quem dirá eu sou?

quem traz no peito o fosso de um Egito longe do Egeu?

*

agora o sol pára sobre o fosso

no peito toda hora é meio dia

num clarão impensado o sol parou

parou para enamorar quem vinha

no cortejo das estrelas cadentes

láctea via aberta em estrada vida esticada viva

na branca

areia seca

tal qual cortejo de estranhas estrelas marinhas.

*

*

Baltazar

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 21/10/2017
Reeditado em 31/10/2017
Código do texto: T6148768
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