Profano

Eu sou o que sou

E ninguém mais comigo

Nem pai e nem filho

Sem espírito

Sequer fui parido

Sem vestes sacramentais

Derramo mais uma taça

De vinho tinto barato

Brindo junto às traças

Ao meu reino que veio dacolá

No lombo de jumentos

Com especiarias e ungüentos

Eu aguento

As invasões bárbaras

Línguas guturais

Ásperas

Cusparadas e chicotadas

O escárnio da face-irmã

Eu sou um e não me divido

Não multiplico

Mal aprendi a somar

Sou o primeiro

Dentre muitos herdeiros

Sombras de outros erros

Mas sem pares que acheguem-se a mim

Sou só

Órfão

Uma criança perdida numa missa

Rezada em latim

Acompanhada de orgão

Coro e mixórdia

Choro

Pai, por que me abandonaste?

Luiz Eduardo Ferreira
Enviado por Luiz Eduardo Ferreira em 11/02/2018
Código do texto: T6251025
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