CESTA DE MAÇÃS VERMELHAS

O tamanho e as proporções

fazem o engano mais perfeito;

João Cabral de Melo Neto.

Ali tão perto do corpo

Há uma cesta de maçãs vermelhas

Tenras e suculentas, tão vivas

Tão ilusoriamente castas, perigosas,

Insidiosas e promíscuas

Atiçando minha fome e desejo.

Mas fora-me irrevogavelmente dito:

— Podes comer de qualquer outro fruto menos deste.

Minha boca secou, meus sentidos morreram.

As outras coisas-frutais têm gosto de nada

As malditas maçãs rubras da cesta não murcham

Não têm grotescos vermes nojentos aparentes,

Não apodrecem, não fedem, não definham,

Burlam o tempo com uma graça não natural

E parecem a cada dia, mais gostosas.

Quanta tentação, quanto sofrimento por este

Pomo calombo incômodo no coração sôfrego.

As maçãs vermelhas e absínticas

Estão ali, ansiando meu toque sereno,

Uma mordida devassa, minha perdição.

Um teste diário de fé e obediência

Daquele que deixou a cesta de maçãs

Derredor e tão, mas tão somente proibida.

Sigo sob o signo de autoflagelo e reclusão,

Não sei até quando permanecerei imortal

Preso nestes quilates de metros quadrados

Deste jardim da Criação primordial.