Dirão que não é certo falar disso,

Dirão que não é certo falar disso,

mas quem liga ao que diz um antiquado?

Embora a muitos Deus seja fictício

ou difícil demais de ser amado,

o que importa se nEle eu acredito

e quero minha vida comportado?

Então falarei: vi na minha rua

uma afronta que fez de mim vexado:

eram dois moços machos na luxúria

cega por um desejar degenerado.

Eu, vendo os beijos ébrios, fogo e fúria,

paixão, fui, de paúra, provocado.

Mas antes de me darem nome feio

chamando de homofóbico enfezado

atenção que meu crime é outro feito:

achei chato foi o todo do cenário;

além de não se imporem o respeito,

não eram um casal compromissado.

Um deles me xingou a tradição

só porque lhes contei que estava errado

beijar sem o cuidado da atenção

aos meios para o amar e ser amado.

Explanou que só querem pegação

e que eu pertenço ao século passado.

Dirão que não é certo falar disso,

entendo; mas ser certo para quê?

Se hoje é dia em que o jovem libertino

aterroriza o mundo sem saber

e se condena a ter seu lar ruído,

e a todos, na ilusão de se aprazer?

Fundamentalismo é desnecessário

para o inteligente perceber

que tudo já começa malogrado

ao casal que a pureza não quis ter,

pois família depende do passado

dos cidadãos que dela pertencer.

Noutro dia chamaram a uma festa,

e eu aceitei querendo me entreter.

Ao chegar, vi Sodoma manifesta

em delírios de Dante descrever:

drogas, som alto, música indigesta,

meu amigo a com moças se perder!

"Amigo! Amigo! Deixa disso, agora!"

Gritei, como quem vê santo planger.

Mas ele, "Conversemos noutra hora",

e se voltou ao seu mal de prazer.

Suspirei e apartei-me sem demora,

não tinha o que pudesse se fazer.

Que tristeza. Liguei o computador

não sei para que; já fui agredido:

apontaram-me a mim conservador!

Primeiro achei que foi um elogio,

mas o amor revelou-se desamor:

conservador, ali, era bandido.

Noutro sítio cristão era legal,

achei ter encontrado um bando amigo.

Engano. Nenhum casto, e por sinal

nem mesmo um do passado arrependido.

Mandaram que eu caísse na real,

pois o importante é crer num tal de um mito.

Então fui conversar com movimentos

de justiça ao direito feminino;

concordei que bastava de tormentos

à mulher que quisesse não ter filho.

Descobri que há alguns homens tão ciumentos

que maltratam por conta de um vestido!

"Os feministas são grupo bacana",

eu pensava. Mas Deus, que erro maldito.

Logo estavam bolando uma campanha

de pintar um cartaz bem colorido

e levá-lo à abortista militância

em prol do copular sem compromisso!

Aí fui pesquisar da vestimenta,

ver se também havia enganação:

desejavam mostrar a coisa inteira

sem de orelha levar nenhum puxão!

À cadeia quem fere a companheira,

mas não o pai que lhe aplica seu sermão.

Saí ovacionado por um povo

gritando "Feminismo é devassão!"

Foi falar "castidade" que de novo

sumiu dessa plateia a gratidão:

ovação se tornou chuva de ovo!...

Como erguem a bandeira de cristão?

Nessa dança, fiquei enlouquecido,

e hoje durmo afogado em depressão.

Todos pecam, mas não era preciso

parar de se esforçar por salvação,

nem inventar que existe outro caminho

sem sacrifício, fé ou contrição...

Dirão não é certo falar disso,

mas ser gentil na boca do leão?

Nada importa se estou sendo mordido,

moído, engolido pela nação

que, sem ser pedida, deu-me este ensino

ela mesma, e hoje fere o coração.

Nada importa se está sendo esquecida

a moral do passado me ensinada

porque cada criança hoje nascida

dela toda ouvirá, na vida, nada.

5-7, 9-14/4/2018

Malveira Cruz
Enviado por Malveira Cruz em 14/04/2018
Reeditado em 16/05/2018
Código do texto: T6308723
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