PAISAGEM

O céu é tão azul como o mar

mas não tem barcos de velas brancas.

O Sol nasce e levanta-se envolto em ouro,

flameja e aquece, mas não sorri.

E quanto mais se eleva mais espalha

um imenso deserto sobre as casas.

Daqui, deste mirante que se debruça

perigosamente sobre o fundo falso das horas,

procuro em vão uma palavra escondida

no rosa-pálido da telha marselhesa,

nos maciços de verde que escurecem ao longe

ou no cintilar prateado do rio que desliza

espreguiçando-se, sem pressa, como uma grande serpente.

Mas nada transparece da embriaguez das cores,

mas nada encontro na calma do tempo morto.

É preciso estilhaçar o vidro da paisagem,

deixar de ser o homem do binóculo

e saltar, resoluto, para o precipício.

Entretanto, o Sol morre lentamente

com cabelos de sangue sobre o mar.

CARLOS DOMINGOS
Enviado por CARLOS DOMINGOS em 30/10/2005
Reeditado em 30/10/2005
Código do texto: T65498