LINGUAGEM AUSENTE NAS ASAS DO VENTO

Por toda parte surpreende por ser vasto e mínimo

e ocultar-se

tanto no ventre escuro de um desejo solitário

quanto na ideia fixa e surda da multidão

espalhada como sementes secas absurdas

o halo, o elo

da língua ávida e muda.

Está na expressão no canto do olho

no sal na palma da mão úmida

quando toca a nuca e aproxima

lábio de beijo e beijo de tesão.

É o espectro de compreensão difusa

que rodeia a fonte luminosa do pensamento.

É linguagem que faz do pintor exausto gênio ativo

e o escritor entre estantes esquecido amante bêbado

de palavra alheia.

É a refração da luz na bruma suspensa,

água ardente tornada vinho tinto.

Mas por conta de um duelo em nós,

cegamo-nos como Édipo em busca da paz gratuita

e entrarmos na prometida floresta do alheamento.

No sonho de judeu errante derramo nas tinas vazias

para que não falte bebedeira.

Sem estar presente fica do meu lado,

verdade.

Somos alta esfera na poeira sob os pés,

vaidade.

Não basta cobrir o fundo vazio do vaso com lama fresca

se o ornamento for tão somente chegar ao verso egoísta

e aprofundar o desmatamento da memória.

Azar é a união poética-política no banquete da república.

Sorte é ver o mar na chuva, dar a face sem lágrima

se do céu desaba mordaça.

Arrebata-nos do rebanho um dedo de prosa,

vamos dançar no escuro da semente

e brilhar na tela do pintor exausto.

Sejamos mirante, miragem do destino sóbrio

para quem se reinventa no endereço bêbado

dessa linguagem ausente nas asas do vento.

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Baltazar Gonçalves

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 22/01/2019
Reeditado em 23/01/2019
Código do texto: T6557019
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