SENTENÇA

Eu sou apenas um poeta

a quem Deus deu voz e verso.

Ivan Junqueira, em Prólogo.

Eu sou apenas um poeta

que nem a morte quer por perto,

porque tudo o que me resta

é o vazio dos meus versos.

Não conquistei prata ou paz

na vida quando a palavra,

em mim, se tornou majestade

das auroras e dos ocasos,

dos dias e das madrugadas

que passo nesta fracassada

maratona, a que insiste

no fim do que é infinito,

na posse do que não existe

e no eco, um todo oco

(o baú do ouro de tolo),

rouco do poço do umbigo.

É deveras sofisticada

a armadilha do poema

(e a sua inexistência

cabal, mas também diplomática):

mesmo que ninguém tenha visto

o seu rastro, ele precisa,

pelo escriba, ser buscado,

porém, e jamais, capturado

no colostro do guardanapo

ou no exato exaspero

geométrico das rosáceas,

pois a miragem do presente

é a dose entorpecente

dentro da veia egoísta

do poeta, que num só pico,

dos fins, se torna dependente.

E teimo nesta empreitada

condenada, nestas maquetes

que ruirão na alvorada,

para tentar mover as peças

− e do meu mestre vem a única

voz que, se caso existisse

(uma, nem rasa nem profunda),

o poema me cantaria

antes numa quase secura

ríspida que cria atritos

entre diversas estruturas...

Aí é que tocam os sinos:

a poesia é fugaz

é feito se fosse um éter

e sou um poeta de nada

a quem Deus deu voz e verso.