olhar obliterado

Andava sem lenço nem documento

Quando avistei um senhor no ponto

Ponto de ônibus

Daqueles que tem uma cabaninha

Ele não me viu

Olhava na direção oposta de onde viriam os ônibus

Ao seu lado um cão

Que também observava o infinito oposto

Meu olhar obliterado

Buscou imaginar

Qual o motivo desta espera

Possivelmente em vão como a de Godot

Nesta ansiedade contemporânea

Misto de paranóia e depressão

Apareceu a imediatez

Tenho urgência, tenho urgência

De interpretar este fato

Urgência de chegar na última pagina

Mas algo que se obliterou

Fica esquecido

E eu lembrava que hoje era o aniversário da minha irmã

O senhor estava simplesmente olhando

E simplesmente como ela

Exercendo o seu direito de ser livre

Olhando contra todas as expectativas

Um olhar contra a corrente.