A rua tinha uma gargalhada cristalina que ecoava no branco-anil do lençol esticado no varal.

Sempre, sempre dia azul-celeste pendurado por um fio de crendice.
Pernas velozes no esconde-esconde suado, matreiro dos pés descalços.
O mistério da janela amarela que nunca se abria… afinal quem morava ali?
O menino que rebolava, mas que vivia trancado em casa, apenas ouvi dizerem… nunca o vi…
No hospital de loucos com alas separadas: os mais perigosos e aqueles que podiam sair para um pequeno passeio, no jardim florido.
Nunca vi loucura neles… eram crianças alegres e cantantes no vai e vem do balanço não havia horário de visitas…
Charretes eram puxadas por burros rangendo suas rodas musculosas de madeira.
Volta e meia pegávamos caronas nas charretes… sem ter um lugar para chegar sempre descíamos no meio do caminho.
 Sempre desço no meio do caminho atrás da gargalhada cristalina.
Desde então o asfalto tomou conta das pedras irregulares e dos campos de piquenique.
Voam meus temores por becos que nunca pensei existir e desvanecem num campo florido de papel de parede; é o que restou.
No coração criaram farpas com som de harpas iludindo os olhos e ouvidos.
Quanta hipocrisia nasceu… até então o cobertor da inocência protegia?
Chegou o desejo tempestuoso revirando todo o meu ser… desejável não pela beleza, mas pela criança dentro da mulher… momento que sentia amada por tudo e todos com seus olhos carinhosos e sorrisos irônicos… a primeira bebida… o primeiro beijo… inédita transa… experimentos abundantes sem qualquer compreensão…
Arranha-céus de emoções nas ruas de gargalhadas estridentes que os meninos que rebolam saem de suas casas… que as janelas amarelas ficam escancaradas na madrugada e que suas donas ficam nas calçadas… e o mundo sente-se engolido pelas pernas abertas do sexo nas bancas de jornais e televisão. O som da bateria have metal sufocando as harpas dos anjos degolados pelo crack.
Acostuma-se com a guilhotina diária.
Em vão tento buscar nas covas humanas a pessoa que se extinguiu vivo num cemitério de mortos vivos de anjos degolados e santos cobiçados pelo seu valor material…
Clemencia… clemencia…
 Aos governantes corruptos
 Aos santos padres pedófilos
  pais viciados
  filhos amaldiçoados
 Crianças tremulas sem o cobertor da inocência.
 Clemencia… clemencia…
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
elaenesuzete
Enviado por elaenesuzete em 09/05/2019
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