SE MARX FOSSE PEÃO

A estância se acordou

Em dia de campereada,

Chiando pelas cambonas

Pra se iniciar a mateada.

De repente, um peão barbudo,

Atando a segunda espora,

Abriu a boca sisuda,

Pondo os olhos campo a fora.

E falou pros companheiros

De mesmo rumo e ofício

Numa tal de mais-valia,

Falando em tom de comício.

Contando um pouco de história,

Revoluções, coisa e tal,

Foi falando de trabalho,

Propriedade e capital.

Terêncio ficou sabendo,

Com os óio arregalado,

O que nunca, então, pensara:

“Todo o peão é explorado?”

E aquele peão barbudo,

Com a melena comprida,

Foi falando, enquanto via

Toda a peonada reunida.

“A peonada leva a tropa

Pra morrer no matadouro.

Esfola a bunda nos basto,

O sol véio queima o couro,

Mas o patrão barrigudo

É que embolsa todo o ouro.

Se madruga todo dia

Pra laçá e curá bicheira,

Se afunda os garrão no barro,

Com essas vaca da mangueira,

E o que nos sobra de tudo?

- Só hemorróida e frieira.

E ainda fazem rodeio

em nome da tradição.

Os boi de língua de fora

Pra alegria do patrão.

O que era duro ofício

Se transforma em diversão.

E tem mais: a propriedade

Deve ser de quem trabalha.

Quem sustenta a casa-grande

São nossos rancho de palha.

Se a peonada joga truco,

O patrão é quem baralha.”

Nisto, chega o capataz,

Sempre de cara amarrada.

O Carlos fica solito,

Falando pra madrugada.

“...E tem gente trabalhando,

Sem ter carteira assinada!”

Cada um pegou seu laço,

Pra mais um dia de lida.

O sol campeiro encilhou

A pampa verde estendida.

E aquele peão, no outro dia,

Pediu as contas, se foi,

Tangendo um sonho distante,

Ouvindo um berro de boi.

Alguns dizem que o patrão

É que o botou porta a fora,

Porque não tinha no lombo

As marcas da “velha espora”.

E seguiu a velha estância

No mesmo tranco, afinal:

Terêncio tirando leite,

Nestor montando bagual.

O patrão com a guaiaca

Forrada dos “capital”.

JUAREZ MACHADO DE FARIAS
Enviado por JUAREZ MACHADO DE FARIAS em 02/11/2005
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