A LÍNGUA

A língua é um navio faminto no meio da maresia

e da salmoura da linguagem que, do azul, ressuscita

e espalha-se no verbo que, no oceano, fez moradia.

A língua engravida de todas as tribos, das manias

daqui e Dalí do mundo. Esta absorção permissiva,

feito uma osmose infinita: cresce dos lados e desliza

abaixo da linha. Ela é vivíssima. Mutante. Oferecida.

Ela é pátria, estado e avenida. É do salão da esquina.

Meu verso tem uma língua, mas obedece a real cartilha

dos homens. A imposição determinante vinda lá de cima.

É por isso que tento destruir as palavras, signos e sílabas

a fim de gerir a instabilidade do poema na gota da neblina.

Não há sucesso nesta tarefa de equilibrar o desequilíbrio.

À língua, as sementes. Ao poeta, a busca da uva no vinho.