A SOMBRA, NO TRILHO

Hoje, não caminho como dantes,

quando saía por aí, estouvado,

arrastando o mundo nas costas.

Mas meus passos ainda ecoam forte,

naquelas curvas subindo, em ar rarefeito,

rumo a lugares que não tinham ninguém,

para me contar os seus segredos.

Aprendi-os saboreando maiores dores,

testando o mundo com a ponta da língua,

em ácidas surpresas e desencantos.

Mas também encontrei doçuras e acalantos

que me impediram de morrer à míngua,

pequenas coisas aliadas, detalhes encantadores

escritos em secretos gestos de dedos,

e em memórias que não valiam um vintém,

mas que em mim produziram esse efeito,

de me acrescentarem peso e porte.

Conheci os caminhos de outras gentes,

cruzei bênçãos com seduções,

aprendi a ler no fundo dos olhares

as canções que as almas cantam,

a ouvir nos esboços dos movimentos

as vontades sutis dos corpos sedentos,

as palavras que, desejadas, encantam,

as minúcias de todos os lugares,

os caminhos das emoções,

os sussurros entre-dentes...

Hoje, prudente,

procuro as sombras, desse trilho

onde me aprendi, lentamente.

Só não sei se as partilho...

Setembro 2007