Homenagem ao meu falecido avô

Tá vendo aquele senhor que hoje está com as mãos calejadas ?

Foi limpando o mato,

Da palhoça e do roçado.

Calejando sua destra forte com as enxadas.

Companheira única e inseparável

Servia de ferramenta formidável,

Para sua subsistência,

Porque para o pobre só está disponível essa ciência.

Quando mais novo foi humilhado,

Porque diziam que sua única vocação era para limpar roçado,

Mas crendo no Deus do impossível, o impossível se tornou verdade,

Com sua companheira e seus 9 filhos ele mudou-se para a cidade.

Mas até a idade mediana,

Isso ele não cogitava,

Pois para ele seu futuro estava predestinado na foice e na enxada,

Mas mesmo com tanta dificuldade,

Tratava os seus companheiros com irmandade.

Ia para o bastio agradecendo a Deus pelos céus azuis,

Cantando para si mesmo,

Os cânticos de Jesus.

Mas como todo santo,

Ele está sendo martirizado,

Não por gente como a gente,

Mas ainda pelo trabalho bruto do roçado.

Hoje ele anda todo invergado.

Não é poeta como eu,

Mas é um sábio nato.

Pena da poesia por não ter ele como expoente.

Pois não foi poeta porquê dedicou sua vida inteira ao campesinato.

Hoje o velho profeta

Chora de dor.

Não aquela que fortalece, mas sim aquela que dilacera.

Com dor olha para o seu neto,

Que hoje é poeta.

Chora, diz concelhos que irei levar para a vida eterna.

De seguir os ensinamentos de Jesus,

Trilhar o caminho da bondade,

Praticando e procurando sempre a caridade.

Hoje olho para as suas chagas,

Tento imaginar a solidão quando era só ele e as enxadas.

Hoje o velhinho olha para a aresta do futuro,

Vendo seus netos conquistando todo o mundo,

E a luz de Jesus aparecendo com Nossa senhora intercedendo.

Mas eu acredito na eternidade,

E no mundo da imortalidade,

Ele será homenageado por sua bondade.

Pelo senhor Jesus será abraçado de verdade.

Isso é o que me consola.

Pois a dor do meu velhinho,

E quando ele chora,

Só me faz crer que um anjo

Já está batendo na sua porta!

Hoje uma luz apareceu para Mané Luiz

Apareceu com uma força potente como o vôo de um cordoniz

E no peito deixou uma ferida que remédio nenhum cura a cicatriz

Na segunda feira ele olhou pela derradeira para sua companheira

Que o ajudou a vida inteira

Viveu uma vida feliz, longe de intriga

Mas disse ao seu neto

Que a luz que o alumia

Seria a mesma que iria o alumiar no dia de sua partida

Mas hoje a luz do senhor apareceu

Nossa Senhora também

E assim terminou a vida, infelizmente sem ninguém

O seu choro me entristecia

O meu Eu interior padecia

E foi assim que acabou minha alegria

Sem meu velhinho do roçado

Hoje choro e soluço dizendo

Que meus olhos também estão vendo

Os negros grilhões da morte

Mas o que me conforta

É que ele um ser celestial

De tamanho angelical

E hoje no seu leito de morte

Ele ficou feliz porquê Jesus e Maria veio dar suporte

Como diz Zé Ramalho, ele não é meu avô, é meu avôhai

Aquele ser que não é só avô mas também é pai

E assola meu peito a dor de saber

Que ele não volta mais

Os olhos fechados

A enxada de lado

E a ferrugem dando nela

Ele com toda certeza chorou porquê lembrou que um dia puxou o cabo dela

O seu choro derradeiro deve ter sido muito forte

Pois dali ele percebeu que a morte era seu norte

E aqui deixou seu neto

Sozinho fazendo mote

Hoje passo pela antiga roça

Vejo solitária palhoça

No meu peito ela está escura como um carvão

Somente porquê seu dono está descansando em um covão

E quando eu passar pelo umbuzeiro

Virá uma lembrança pertinente

Ele virá me abraçar e eu digo- Não me desprende-

Porque na Terra só o senhor me entende

Para o senhor fica a imortalidade e para mim fica a dor

Até a beleza dos versos e da natureza

Parece tão incolor

Isso tudo porque eu perdi meu grande avô

Cardoso de Figueiredo
Enviado por Cardoso de Figueiredo em 12/08/2019
Código do texto: T6718570
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