Linhas para você, Luana.
Um velho poema que não foi escrito.
O doente terminal que ainda não morreu.
O desdém no olhar de um gato
enquanto lambe os próprios pêlos.
A fome.
A embriaguez.
A caminhada sem destino, sem sentido.
O bar quase vazio, como um doce inferno no meio de um paraíso decadente.
Caetano lamentando estranhamente no rádio:
“Eu quero a sorte de um amor tranquilo...”
enquanto um bebum grita pro garçom: que som de bicha é esse, porra?!
Nada está certo.
Nada está errado.
Os ônibus seguem.
Os desempregados lêem o horóscopo em jornais de R$1 esperando o melhor dia para entregar currículos.
As motos barulhentas correm e
são empinadas por eunucos ao longo da avenida.
As serralherias e seus sons.
Os mercados,
os cabeleireiros, as farmácias,
as bancas de revista,
os açougues.
A gritaria na porta de uma casa de jogo do bicho.
Os varais e os jarros de flores amontoando-se em toscas varandas apertadas.
Tudo está certo,
Tudo está errado.
Essa é só mais uma tarde que segue sem lucidez
e repleta desse velho e lodoso tédio familiar
que me abraçará firme
até que eu caia em minha cama, retorcido.
Até que eu acorde,
sozinho, em meu quarto silencioso,
pensando como seria a salvação
de me derreter no tumulto dos seus cabelos
enquanto o teu olhar
triste e disperso
me faria ter a certeza
de que uma paixão que não deve nascer
ainda vale a amargura que carrega.