Linhas para você, Luana.

Um velho poema que não foi escrito.

O doente terminal que ainda não morreu.

O desdém no olhar de um gato

enquanto lambe os próprios pêlos.

A fome.

A embriaguez.

A caminhada sem destino, sem sentido.

O bar quase vazio, como um doce inferno no meio de um paraíso decadente.

Caetano lamentando estranhamente no rádio:

“Eu quero a sorte de um amor tranquilo...”

enquanto um bebum grita pro garçom: que som de bicha é esse, porra?!

Nada está certo.

Nada está errado.

Os ônibus seguem.

Os desempregados lêem o horóscopo em jornais de R$1 esperando o melhor dia para entregar currículos.

As motos barulhentas correm e

são empinadas por eunucos ao longo da avenida.

As serralherias e seus sons.

Os mercados,

os cabeleireiros, as farmácias,

as bancas de revista,

os açougues.

A gritaria na porta de uma casa de jogo do bicho.

Os varais e os jarros de flores amontoando-se em toscas varandas apertadas.

Tudo está certo,

Tudo está errado.

Essa é só mais uma tarde que segue sem lucidez

e repleta desse velho e lodoso tédio familiar

que me abraçará firme

até que eu caia em minha cama, retorcido.

Até que eu acorde,

sozinho, em meu quarto silencioso,

pensando como seria a salvação

de me derreter no tumulto dos seus cabelos

enquanto o teu olhar

triste e disperso

me faria ter a certeza

de que uma paixão que não deve nascer

ainda vale a amargura que carrega.

O Bêbado
Enviado por O Bêbado em 25/08/2019
Código do texto: T6728925
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