VERSO DE AZUL

Havia quem me contasse histórias...

E a noite vinha muito cedo

Porque a velhinha da minha infância

Dormia cedo e se chamava...

Dindinha!...

Arisca feito a menina de ontem,

Altiva como a figueira guapa...

Contou-me o primeiro encanto

Que a noite sabe guardar

Em seu baú de recôncavos...

Cantou-me a canção primeira

E dedilhou guitarras invisíveis

No aramado azul do meu peito...

João e Maria... Pedro Malazartes...

Tinha vários livros no cofre da alma

E me deixava folhear um a um...

Fazendo neles “orelhas de burro”,

Machucando a face das páginas...

Havia quem me contasse histórias...

Madrinha do meu irmão maior,

Eu a fizera minha também...

O doce do pão-de-ló ficou na língua

Da minha saudade...

E quando ela se foi,

Me revelou o primeiro assombro...

Ensinou-me as lágrimas,

Ensinou-me o lenço,

Ensinou-me a morte...

E querendo secar meu pranto,

Subiu num fio de luar

Para o espaço azul

Do meu sonho.

Sentou-se num floco de nuvens

E de lá me olha e sorri,

Sem jamais tirar a dentadura...

Por isso, a noite é berço de ternura

Que eu soube garimpar, quando guri.

JUAREZ MACHADO DE FARIAS
Enviado por JUAREZ MACHADO DE FARIAS em 05/11/2005
Código do texto: T67698