IMAGENS NOTURNAS

A invernia extemporânea

plasmou a noite de outubro

de um negror sombrio, gelado,

que faz lembrar os agostos

de acinzentadas lembranças

que bailarinam na mente

de quem, arrinconado em si mesmo,

voa, voa longe em sonho alado

nas asas de ouro matiz

do baio ruano do tempo.

Alguma ave noturna

ruflando as asas cansadas

remexe flores e folhas

trocando o lugar do pouso.

Emite tênue alarido

de poucas notas sonoras

depois, desce a calmaria

cobrindo os entes da noite.

O pássaro acomodou-se

no poncho da pitangueira.

Há uma quietude no ar

de inquietar a própria calma

propiciando, nesse instante

de contraste à paz interna,

que se desfolhe a memória

e acendam lumes na alma

enquanto os olhos perseguem

a tênue espiral de fumaça

gerada na incandescência

do palheiro em queima lenta.

Ao tranquito sorvo um mate

saboreando gosto e aroma

do amargor verde da erva.

Ensimesmado componho

frases soltas de um poema

que das turbulências da mente

vai saltando, dando vida

para a folha branca e nua

de um papel que amarrotou-se

no descaso das gavetas.

Tal falena ou vaga-lume

se destapa o poemeto

viajor na luz que brota

da imagem doce da prenda

que nessa noite invernosa

vem povoar reminiscências

de quem, buscando ave rara,

não percebeu a calhandra

sonorizando os silêncios

dos descampados da alma.

Essa invernia lá fora,

divorciada do seu tempo,

me timbra em cinzel de outono

que já passou por um tempo

hoje longe em teus recuerdos,

pois na aura sol nascente

de abrandar feras e fúrias,

tens frescor de primavera

contrapondo a face nua

da lua que habita em mim.

Nessas horas, noite alta

que me desprendo do corpo

cavalgo ao astral da pampa

num potro, raio de luz,

onde te encontro, vestal,

sacerdotisa de um templo

no etéreo azul do planeta

onde os bardos sonhadores

dão vida aos desassossegos

pela prenhez das guitarras.

Pois nesse rincão secreto

que só poetas e amantes

sabem das trilhas e portas,

temos um rancho plantado

do qual vislumbro de longe

a soleira emoldurada

pela morena silhueta,

depois a mútua nudez

dos corpos em harmonia

no aconchego dos pelegos.

Por isso, do meu sorriso,

ar radiante, alma leve

quando me encontras vagando

pelos caminhos terrenos.

Quem desfruta encontros lindos

nas dimensões superiores

com a prenda, musa dos versos,

tem tudo pra andar voando

feliz, alegre, bendito

com vontade de chorar.

Mas notando de relancina

nos sulcos fundos do rosto,

descer de jeito escondido

lágrima tardia e só

tal qual FLASH fugidio,

não há tristezas, nem mágoas

não faz caso, não liga,

me perdoa, me acalenta,

pois, nesse limiar do tempo

eu ando chorando à-toa.

moises silveira de menezes
Enviado por moises silveira de menezes em 07/11/2005
Código do texto: T68315