O ABOMINÁVEL HOMEM DAS NUVENS

Mastigava o meu sol que, recente, já me socava o estômago

Como quem alimentava a algum demônio no ventre eu seguia

de restos em restos tentando sobreviver da bondade inimiga

Quem vive sem quase nada é nada para quem tem quase tudo

Não sabia se ter tudo ou nada tinha cara de mundo ou de alma

Apenas sabia o que me aliviava a fome e a fome de um nome.

Tinha sempre a alma enroscada entre as mãos indefinidas

Ora exaustas de carregar lixo e sopapos das esquinas

Ora livres como asas de um beija-flor juvenil no beijo de amor

Com quanto dinheiro se edifica o Castelo da Felicidade?

Em qual terreno se pode construir a duradoura alegria?

Há em nós algo que não apodreça pela causa do uso?

Eu me usava nessas questões para justificar o meu ser.

Como disse, vivia do lixo. Catava restos para restaurar

Talvez para ajudar a reciclar o planeta cansado de ciclos

Quem sabe amenizar as seculares barbáries ecológicas

Ou, oxalá, ajudar a reduzir o caos inevitável do amanhã

Não. Eu catava lixo para sobreviver mesmo. O resto era resto.

Tinha curso superior e morava na rua. Por sina ou falcatrua?

Por escolha ou devido às faltas de escolha sem explicação?

Apenas queria viver do meu jeito. Ter curso superior não me

deixou superior ao desemprego. Então, pulei ao coração.

[continua]

John Grafia
Enviado por John Grafia em 12/05/2020
Código do texto: T6945242
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