PANDÊMICA

Contamos nossos mortos

E seguimos em frente

Como quem está em uma sala de espera

E não sabe quando será chamado

Contamos nossos mortos

E irmanamos nossas grades

O sangue já tem outras nuances

E o choro é a oração que se perdeu

Contamos nossos mortos

Como contássemos uma narrativa triste

A alguém que está ausente

Querendo mesmo acreditar

Que tudo não passa de ficção

Contamos os mortos: são tantos

Têm nomes, histórias, sonhos

Defuntam suas vozes

Na medida do impossível

Que bom se a poesia

Fosse uma pandemia

E o verso o único vírus

A contagiar o mundo.