O vento calmo

O vento calmo

Nem mesmo o vento que sopra pôde se abrigar em parte alguma.

Antes parte para sustentar de vida o movimento das árvores.

As plantas gracejam a incerteza quase eterna de uma vida, na mesma faina, da nossa efêmera passagem.

Cai assimétrica, essa chuva de palavras,

faíscas no horizonte pungente, na cor alva do berilo, abrindo caminho entre as nuvens escuras do entardecer.

São raios brancos do fogo de Deus!

A quem diga relâmpagos, demoradamente se movendo nesse céu brunido de estanho.

As minhas palavras não sabem fabricar, nem desenhar essa cor que vejo agora!

É a cor das nuvens, em dias solitários de um poeta,

nuvens de chuva, de um escuro e cinza imprecisos!

E o cheiro é de chão queimado, molhado pelo sereno.

Espanta o cheiro calmo que havia dentro das casas, e empresta seu odor de terra cozida. Cheiro doce, cheiroescuro!

Estou pronto a escrever, mais me vejo a muito num campo vazio.

Morrem as frases sem medo algum de nada dizer...

São os poemas que seus olhos desejam, mais que não tenho!

Taças brilhantes e o vinho estático, repousado!

Escrevo para mim tão somente sem querer ofender ninguém!

Apenas meus irreverentes sentidos, cheios de ego enfim!

E enfim...

Passam a flertar os carros nas altas da madrugada...

E essas luzes das cidades ao longe, luzes ao longe nos itrincados caminhos da solidão.

Barulhos que ferem o silencio, luzes girando nas paredes do quarto.

Há o silencioso coração do apanhador de ventos...

Dos ventos calmos que um poeta arrebanha em palavras!...

E que não dizem nada!

Francisco Cavalcante