A ironica obra fundamental

XXXVIII

Oh poeta, que esoeras tu dos teus versos?

que o mundo te faça uma vénia em mudança,

que a donzela corra por ti e avança,

que o mar te desvende seus segredos emerssos?

Que ainda esperas da poesia

não tem mais para onde ir a inspiração?

para os deuses tudo isso é vão

e a musa já possui o que queria.

Que te obriga a ser poeta,

porquê continuas a descrever o negro fado,

mergulhar na intenssidade gelado

e deixas o vento entrar na janela aberta?

Não era melhor que a deixasses,

te libertar dessa desgraça demais,

ir ao mundo dos prudentes nortais,

e para a dura realidade voltasses?

Não te entendo aí curvado

nesse oficio de tão nobre pobreza.

De onde vem essa natureza,

batendo o dente como cão danado?

Antes de ti outros padeceram

excumungados como bruxos, falssários

deles só ficou a memória nos armários

e o tempo consumirá o que eles sofreram.

De que te serve a honra tardia,

o busto depois de morto,

se em vida são um estorvo

e nem valor dão oa que dizia?

Essa tua felicidade é loucura,

faz-me sentir decadencia

ver desvanecer a tua essencia,

nesse teu rosto de vida não segura.

Agora nessa cama de hospital

faminto, sombra do que podias ser

ninguém te veio ver

fechas os olhos agarrado á tua "obra fundamental".

É nisto que acredito- acredita

-que a poesia é mal empregue

não te serve nessa vida de plebe,

morres-te só, agarrado á tinta.

Ves agora o futuro que tens

por não abrir mão da poesia

longe do mundo material, da hipocrisia.

És agora imortal parabéns.

miguel lopes

miguel lopes
Enviado por miguel lopes em 11/11/2005
Reeditado em 29/12/2006
Código do texto: T70059