DIVAGAÇAÕES SOBRE UMA PASSANTE AO ACASO

Sem recordar os seus olhos,

dois luzeiros cintilantes,

mirando um ponto qualquer

lembro a vã tentativa

de lhe chamar atenção

enquanto aguardava alhures

idéias quase em desordem

um gesto mudo, suave

que na alusão mais singela

passarinhasse um sinal.

Sinal é o que se percebe

num gesto sem pretensão,

cabelos lourando ao sol,

trigais tremulando ao vento

instantâneo inesquecível

colorindo o gris da tarde

na pequenina cidade

distante dos megacentros

fazendo a gente viajar

num sonho sem tempo certo.

De onde teria vindo?

d’ algum rincão escondido

quem sabe, d’ outro planeta?

Não importa de onde veio,

a percebi de repente

como brotando do nada

quando pousei o olhar

na silhueta que surgiu

envolta em véu de silêncio

entre os gerânios da praça.

O andar de passos leves

num levitar ritmado

como as antigas canções

de embalar sonhos e medos.

No olhar, fulgor de aurora,

imagem de abrandar fúrias

lembrando na relancina

à espreita, raios de sol

dourando por entre as brumas

dos cerros do Guassupi.

Alvorescências de outono

em sóbrio quarto minguante

transparecia no rosto

como a inquietar a quietude

da calmaria da tarde.

Quem sabe, viesse de perto

trazendo ainda o frescor

das crespas águas do rio

lucifulgindo um prenúncio

do fim do fim do verão.

Esguia, bela, elegante

como essas garças de bando

que surgem nos fins de tarde

no espaço delimitado

dos açudes e lagoas.

Um gestual bem estudado

como alguém que retardou-se

para viver o intermédio

entre os que ontem se foram

e os que virão amanhã.

Nas horas calmas de ausente,

solito com meus guardados

divorciado da matéria,

a imagem chega de manso

como quem vem para ficar.

O porte altivo que evoca

princesa moura encantada

com aura de luz solar

no contraponto das sombras

das luas nuas da gente.

Sem recordar os seus olhos

guardei visões fugidias

para tentar num relance

compor-lhe perfil à altura

de fêmea, doce, harmoniosa

dessas mulheres comuns

do sul do sul do Brasil

que passaria a lo largo

se um tênue raio de sol

não lhe enquadrasse a figura.

moises silveira de menezes
Enviado por moises silveira de menezes em 11/11/2005
Código do texto: T70119