O DIA
(do meu livro "Rosas Do Vento", 1987)
O dia amanheceu
com cara de noite.
Chuvoso e frio - muito frio.
Triste, enfim.
Ninguém ou quase ninguém
se vê pelas ruas,
não há nenhuma ave no céu...
A cidade cinzenta
parece não ter vida
parece ser um elo perdido
entre a realidade e a realidade...
Ligo o televisor
e o jornal noticia o que
é lamentável, o que parece
inevitável, sem o ser...
O dia amanheceu
e trouxe consigo, seus mortos
vítimas do frio e do abandono
e do descaso...
A estatística é cruel
e já prevê outras mortes
como se fizesse apostas
num jogo qualquer.
Ironia ou não,
o sol aparece por instantes,
como quem vem dar seu testemunho
e registrar seu pesar...
A cidade respira esse momento
de luz - que pouco dura
e o dia, disfarçado de dia
se volta novamente
para a noite que se impõe
a noite que esconde a esperança
a noite que esconde a verdade
a noite que esconde a coragem
e a vergonha dos homens...