Ode ao coração marujo

Coração em chamas, hálito de vingança,

são rezas de um marujo, que confuso,

troca oração por trama e desencana.

Seguindo os rastros feito carrapato,

por um breve afago, fica de campana!

Quanto mais sofre, mais tem gana,

quando ganha, foge. Que desacato!

Se sair por aí a bater apaixonado,

o amor que nos acuda, ou que nos iluda!

Mas, se lhe amordaçar seu entusiasmo,

Sai da frente! Eis um trator desgovernado...

Quando palpita feliz declama Neruda,

mas quando triste, bate a revelia, feito asno.

Se é para ser dominado prefere a morte,

mas, quando tentam o subestimar, boa sorte!

Bate, bate, bate, bate, mas nunca se cansa!

em cada tum-tum-tum-tum-tum, sóbrio,

ou alucinado, se é reciproco ou platônico;

bate, bate até o último fio de esperança!

Toda batida é um cântico de louvor à vida,

muitas vezes arde num cântico caótico,

noutros, um oásis de fino trato, mas, simplório.

Em céus alados traçando intermináveis planos,

soando no sossego do luar dos céus serranos,

como se a próxima pode ser sua última batida.

Seu palpitar é a mais pura de todas as poesias,

alcançando existências que vão muito além

do que aquilo que pode ser visto ou tocado.

O que terá em seu ensejo mais profundo,

apenas outro como ele em bater palpitante,

pode compreender todas as suas teorias.

No amar: PHD, no entender a razão: refém...

Mesmo quando bate meio enferrujado

bate com emoção, mesmo que bem lá no fundo,

que de tudo que mais ama, está distante...

Bate coração em ritmo alucinado,

mas quem irá querer explicação

de um louco assim tão desvairado...

Peregrino das noites de verão,

cancioneiro do anoitecer dissimulado

entre fogos de artifício e simulação.

Marinheiro das noites mal fadadas,

tocando sua elegia em batidas tolas

sobre as auroras febris da insônia,

onde o silêncio são falsas bússolas

em céus ardis de escusas toadas...

Palpita num de nostalgias estreladas,

com olhos que vigiam das cordilheiras

a ânsia das estrelas derradeiras,

os vastos jardins da Babilônia,

sementes de histórias mal contadas...

Estrela Dalva no caminho dos errantes...

Ó coração, tesouro divino e peito humano;

Oásis maternal acalentando o fogo dos amantes!

Em seu segredo ledo, dia após dia, ano após ano,

louva à Deus nos acordes de mil odes triunfantes!

Mesmo em disfarce do maior descontentamento,

nele não se cria qualquer engano...

Bate com pureza e comprometimento...

Ó badalar extravagante!

Que por mares tempestuosos

abarca a mais simples das levezas,

(as dos marinheiros sonhadores)...

O céu e como um rebanho de ardores;

coração poeta pastoreia perseverante

que desce as encostas como velas acesas

iluminando sagrados versos luminosos.

Não sabes por que bate, bate apenas,

no fulgor rítmico de sua inocência ancestral,

em batidas seguras de uma canção serena;

como uma coisa que ocorre ao natural...

Em seu divino palpitar,

a senda divina,

em sulco de adrenalina,

vem no homem habitar.

Numa dança cristalina;

é morada do amar...

Ao apagar da luzes, o último ato,

a reverência, o muito obrigado,

a chegada, a partida, de gaiato!...

Traz o óbolo, a chama derradeira,

de leveza pura em manto adocicado

de quem palpitou a vida inteira;

no crepúsculo dos deuses alados,

com toda a certeza tida,

aos quatro ventos anunciado:

Valeu a pena cada batida!...

Joselito de Souza Bertoglio
Enviado por Joselito de Souza Bertoglio em 29/03/2021
Reeditado em 29/03/2021
Código do texto: T7218505
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