COMO SEMPRE FARÁS

Vieste todo folguedos, todo querer-bem,

vieste todo afagos, todo cheiro-bom,

vieste todo mansidão, todo certezas.

E eu, desarmada, abri todas escotilhas,

todas portas, desfiz todas sentinelas,

debandei todas cercas, todos cães de guarda.

Vieste pra ancorar, pra fincar teus pés,

alegrar meu útero, minhas mamas, meu ar,

alegrar meu suor, meu chão, meu calor.

Então fizeste estrago, tamanha algazarra,

descampou minha pele, desanuviou meu gozo,

encardiu o que tinha de mais sagrado,

mais aprumado, mais apurado, mais só meu.

E foste embora sem olhar pra trás,

sem dizer adeus, sem recompor meu respirar,

sem estancar meu desmoronamento,

sem acudir minha dor, minha solidão.

Fiquei à deriva, calada, retalhada,

só aguardando que vieste de novo,

pra atormentar, esgarçar, esmigalhar,

como sempre fizeste,

como sempre farás,

meu amor.

Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 21/05/2021
Reeditado em 21/05/2021
Código do texto: T7260487
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