LÁPIS-LAZÚLI (1)
AFLIÇÃO
O balanço da cilada que se arma
na aranha da alma.
Uma instância repousando o espírito.
O balanço desta miragem,
uma aranha na ciranda da garagem,
um espírito na balança da aragem.
A deusa e sua balança,
a semana e a sua dança de alienação.
Neste instante, a ternura dissipou-se,
uma trança embelezando o terrível da discórdia
no meio da semana e dos lords.
Uma dança de aranha, a trança da indústria
força a balança, morada do espírito
nesta terra sem lembrança.
A deusa arrebata deuses na aragem
e todos se distanciam, arrebatam a discórdia
e a cilada toma o nome de cigana.
O balanço distante da aragem encaminha seus lords contemporâneos
para a miragem da semana e mais a aranha e sua ciranda.
O balanço, já não há descanso para o corpo
que transborda a sua ciranda estranha a si mesmo.
A viagem da aranha na semana sem alma
que arranha a terra e ordena a ciranda.
O único balanço que agora furtivo arregimenta o corpo
num estranho descanso onde o espírito contempla
a miragem da semana em alienação.
E a balança agora conclui o seu contrato com o tempo
e a dança da terra nos concentra.
Venta... e a ciranda dos lords estranhos a si mesmos
contrata a aranha da indústria e a deusa desmancha
a trança de seu milagre.
Porque na aragem agora balança o corpo
e uma aranha sob uma dança e a viagem da semana sem lembrança.
E a miragem da deusa resplandecida e sua indústria de aliança
perde-se dentro do corpo e da aragem exterior,
findo o contrato com o amor, arregimenta o balanço
o seu estado de ciranda e a aranha neste instante contrata
a sua semana de cilada.
Já o corpo se larga
como um ritmo de sorte
e o contrato com a queda estabelece
a base da indústria da cilada.
Já a deusa refaz sua aragem,
contradiz a semana.
Estranha a si mesma
se confunde a aranha.
E o balanço passa a se fazer trança,
a cilada da expectativa do que se desmancha.
Porém a semana traz
a sua ciranda à realidade
do balanço novamente, continuamente,
e a aragem da aflição,
por tudo isto, desafia uma dança
e desfia sua trança como uma teia.
É a teia da ciranda na semana de quem manda.
Final de linha. Aflição que nos comanda.
FLORESTA BRUTA
Crescer nesse triste mundo
é algo enlouquecedor.
Um mundo que guarda a bomba
de todos os nossos conflitos.
Crescer nesta floresta bruta
de arranha-céus, de trabalho injusto.
De medos reprimidos e acovardados.
Pedras de metal nos soterram.
Rios de dinheiro nos alucinam.
Não há nada de mais rude,
de mais violento,
do que crescer dentro da floresta bruta.
E ter rugas do progresso,
ter os olhos vermelhos de neurose
que testificam a perdição
de nós todos... seres martirizados!
Criaturas se movem
embaçadas de fumaça negra.
E são monstros de um tempo.
São máquinas que aprendem
tão-somente destruir.
São almas que agitam
no mais sórdido, no mais vil,
comercializando o sexo e
calejando as mãos dos escravos.
Viciando os estúpidos inocentes.
Floresta bruta que vai crescendo dentro do mais negro cenário, movida por seres que carregam consigo todo o mal, que nos levam a matar, a sangrar, a guerrear, a estuprar e espedaçar.
Ah! tão triste é crescer nesta floresta onde nascemos com um número,
nascemos escravos de algo lastimável que nos tortura até o final dos dias.
Mas, quando se olha para o alto, não se vê melancolia, nem a crueldade, nem o trabalho injusto, nem a fumaça negra.
Quando se olha para o alto desta floresta, vê-se uma grande escalada e estrelas suaves a fantasiar o mais colorido coração humano que não carrega o triste peso da discórdia.
É no alto, no mais celeste do céu, que se enxerga o verdadeiro homem, e é da grande escalada da esperança que se situa o ponto de partida do ser humano para a paz do infinito.
E é justamente nesse momento que a vida gritará:
_ Adeus! triste floresta bruta, tão grande foi a sua necessidade.
SONHO
O sonho só é válido quando se origina do sofrimento, pois o sonho que dá origem ao sofrimento só nos dará decadência e infelicidade.
Porém, desta verdade tão simples ninguém se aproveita.
O homem pensa que o sofrimento causado por seus sonhos é o caminho,
mas o sonho está aliado com a experiência.
Repito: só é verdadeiro aquele desejo que emerge do sofrimento de homens justos.
SEXTA-FEIRA I
É sexta-feira e a tarde é apenas silêncio.
Tão-somente um pardal pia no céu.
É sexta-feira e eu solitário em meu recanto.
Olho para o rádio e para a lâmpada,
olho para tudo que me acompanha.
A rua está silenciosa e o vento não faz questão, tudo é parado, nada se mexe nesta tarde seca.
A cidade ao longe ruge e o galo canta, a cama larga-me prostrado.
Ao longe vejo edifícios e aqui vejo um casebre.
Ao longe vejo um avião e aqui vejo uma carroça.
Quantas diferenças estão naquele ponto infinito? lá não existe união, lá todos já estão obscuros.
Quantos desafios estão naqueles mundos enfeitados, lá a juventude é o resultado do sangue dos adultos.
É sexta-feira e uma moça está passando pelo asfalto.
Um pássaro pia novamente e o sol embaça o horizonte alto.
As nuvens estão claras em minha mente.
Sou um insatisfeito e guardo uma utopia que não ambiciona o desespero de ser feliz.
É sexta-feira e um automóvel grita no silêncio, a minha coragem derrapa no peito, os pássaros dizem em forma de cânticos para não lutar.
Minha mão prende aquele sol, mas o sol quer viver em liberdade.
Minha prece erra quando procura Deus que entende de nossa liberdade, dileto.
Tudo acontece nesta tarde tépida.
SEXTA-FEIRA II
Lá fora há uma triste pessoa que implora.
E o veneno destrói cada hora e o infinito aborrece a confiança.
Esta tarde se destrói e o meu peito tem o mesmo fim.
Tudo há de se acabar porque o presente é uma mansão de pó.
É sexta-feira e minha mente se confunde, meu pranto se confunde entre fantasias de felicidades.
Meus dedos estão sós.
Tenho sede e tenho medo. E esta tarde vai me matar?
Tudo parece tão longe e as pessoas distantes...
Diviso apenas a ominosa sombra do destino que diz: pobre homem, procure ser feliz...
FORCA
O que chegou frente a frente revelou estar par a par com o sangue impar que vem garantir a sua custódia sobre o corpo que se choca com a escolta.
O que vai em volta em volta é o personagem que intercala sua revolta e revive a sua montagem na imagem que se solta, pressentindo a tatuagem no mausoléu.
O que chegou de véu em véu vai com ironia escurecendo o céu e derrubando estrelas de alvo em alvo frente a frente até já não estar a salvo.
De retaguarda em retaguarda vem se revelando as armas dos diversos guardas que sinalizam a súmula, o cúmulo do senso que acumula.
Uma mula requebra a altíssima referência.
De que se revela a súmula da indiferença.
Frente a frente um laço se comprime e a forca reservada ao espaço perpetua o seu crime num só passo.
O passo de quem frente a frente vai se aproximando do martírio e o colírio sobre a cólera fortifica a coleira de um fiel condenado à sua sentença no mundo cão.
Frente a frente as últimas batidas do coração.... abstinência.
Atrás o silêncio das vidas
em conivência.
CONDECORAÇÕES
Está um vagabundo na noite escura com sua dama e o seu mundo na noite da metrópole impura.
Ironicamente na poluída aragem condecorava a sua vadiagem.
Expunha as medalhas, reunia a malandragem e para as muitas falhas rendia as medalhas em sua homenagem.
Está na noite escura, eu repito, um vagabundo na noite de nosso mundo aflito,
Contradizendo o que acontece na sala dos poderosos.
De medalha, a prostituta mais linda ele abastece.
Há que se notabilizar pelo coito mais produtivo.
Assim distribuía o vagabundo as homenagens com voz sentida, ironicamente a caçoar da vida.
Está um trasmontano condecorando a prostituta que mais lucrou este ano.
Na praça isolada e fria, na noite da metrópole embaçada, personagens em cena de agonia, recebendo seus prêmios na sarjeta da calçada.
A voz do vagabundo se expandia, voz de quem não espera nada mais da vida.
Dramaticamente talvez, cercado de esfarrapados, abandonados, doentes, desamparados de uma urbe sinistra e miserável, gritava e distribuía condecorações para aqueles que viam mortas todas as ilusões.
Decadentes e marginalizados a receber medalhas cinicamente na noite fria da metrópole.
Palco de expectativas ardentes.
Está um vagabundo na noite escura com a sua dama e o seu mundo, na noite, eu repito, da metrópole impura...
FERNANDO MEDEIROS
primavera de 2005