DECOMPOSIÇÃO
Vejo as cáries da noite fria
e seus dentes que se afiam
nos paralelepípedos da guia,
ali, no outro lado da avenida.
Costuro as dores contínuas
dos emaranhados de feridas
que se põem abaixo e acima
da hora e dentro das vísceras
que, entre pausas, mastigam
a bile umbilical das mentiras,
da insensibilidade e da agonia
de não ser o que eu pretendia.
Corto os pulsos com esta linha
repleta de cerol da minha pipa
fadada ao chão e não à poesia
deste verso inútil que definha
no ocre do ocaso (onde descia)
e no lilás da aurora (onde sumia).