Rota de fuga
Tudo o que era sólido vai virar o pó
E tudo que era branco vai empretecer
Foram anos de privação e fome
Nos negaram até o nome
Nós fizeram trabalhar do amanhecer até ao alvorecer
Não teve sol capaz de me aquecer nos dias de frio
Frio e febre e saudade e ainda mais fome
De falar minha língua usando minha tongue
De ver florescer minha platation
Ouvir cantar nossas estórias, fazer soar os nossos sons
Chegou a hora de fugir, escapar disso daqui
Vou logo ali, refazer meu tom, tonalizar minha pele
Não tem quem me pegue, quem me impeça de chegar
E quando eu estiver lá, vou plantar, regar, colher, juntar tudo num alguidar
De tudo que era escasso vou arrancar o maior naco, vou fazer render , vou fazer florescer onde se só via chão
Vou fazer chover no meu pomar, encher meu celeiro, refazer o meu lagar
E eles vão olhar e dizer “que beleza de plantação”
Vão usar até de adivinhação pra tentar roubar meu quinhão, vão tentar me expropriar
Ah, mas não vão conseguir não
Bom, já tempo de dar às costas pra privação, de juntar com meus irmãos
Dá licença, vou me embora, que é chegada a nossa hora
E vai ser agora que vamos nos fartar de bananada
Vou me lavar debaixo d’água água doce
Vou me alimentar minha alma, vou sorver o gosto dos lábios mais doces
Da água de coco e do inhame
De dendê e vatapá
De quiabo e cerveja preta
E também do milho branco e da água do mar
Serão anos de fatura e gozo
E não vai ter quizila que vai me parar